quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

O peidinho Guarujaense


Moro onde você passa as férias.

Nasci em Guarujá, cidade do litoral sul do estado de São Paulo. Era noite de 12 de maio – quase 13 - de 1983, época em que a cidade ainda era chamada de “A Pérola do Atlântico”. Como reluzia essa pérola, que virou bijuteria e ninguém me avisou.

Por tempos a cidade ostentou as mesmas características da jóia que mora no coração de um bivalve: era bela, valiosa e muito difícil de encontrar. Suas praias excitavam, seus marajás ouro gastavam e a viagem até o Guarujá durava longos e ansiosos dias. Malditos imigrantes.

O transporte naquela época era o bonde, que quebrava muitas vezes. Quem dera que esse fosse o único “bonde” que o guarujaense tivesse que um dia aguentar.

Apesar da recente melhoria do acesso na última década, Guarujá continuou sendo bela e valiosa. É aí que mora o perigo. Dirigir uma cidade bela é massagem no ego do status, agora dirigir uma cidade rica é a massagem no ego do poder. Quanto mais dinheiro, mais poder. Quanto mais poder, melhor! Whisky e bocetas, yeah! Estou no Paraíso, Padre Domênico?

Guarujá ganhou rotina, e sua prefeitura também. O povo é a cria da administração que tem. O “jeitinho brasileiro” fica no chinelo perto do “jeitinho guarujaense”. Com o perdão da rima, confesso que esse jeitinho um dia me pegou também.

Seja um lixo mas cheire a luxo. Pareça o que não é, perca a identidade e entre para o clube. Se o clube ficou pequeno pra você, entre num clube maior. Quanto maior o clube, mais gente nele cabe. Quanto mais gente, mais fácil pra peidar e jogar a culpa em alguém, né? Um peidinho atrás do outro, já sabem no que vai dar.

É quando surge nosso primeiro personagem, que chamo de Bonitinho. Com o status quo de importante, o Bonitinho acha que conhece a cidade inteira, que é querido por todos e que o mundo está aos seus pés. Muitos deles se candidatam a vereador, e um ou outro acaba chegando lá. Mas a maioria só barganha cargos, promessas e ilusões e, claro, sem tirar os pés de cima do mundo. Bonitinho até morrer.

O Zé-Povinho é um sujeito esperto e muito vil, viu? Mas traiçoeiro. Sorrisos e tapinha nas costas é com ele mesmo! Mas a mão que dá o tapa é a mão que aponta o dedo. O Zé-Povinho a tudo ouve, de tudo sabe, e tudo conta a quem tudo lhe oferece. Ou não, sai contando à esmo mesmo.

O Zé-Povinho é uma espécie avessa ao sucesso e a felicidade alheia. É invejoso e distribui energia negativa gratuita, não porque ele queira, mas porque ele é o Zé-Povinho. Não sei como e não sei por que, só sei que é assim.

O Bonitinho e o Zé-Povinho ainda gozam de prestígio social e político, coisa que o Guarujento nunca teve (até este momento). O Guarujento é o pobre metido a besta. É porco, mal educado, ignorante, mora, vive, come e fala mal, fede mas cheira a jasmin. Seu poder de reprodução espanta o mais fértil dos coelhos.

Sonha em se tornar Bonitinho, e pra isso não se importa em virar o Zé-Povinho antes. Aos poucos vai galgando posições mais elevadas, muitos deles se tornam vereadores e concentram poder em suas mãos por algum (ou muito) tempo. É como dar um pote de fezes a um primata e apontar o ventilador.
Vai dar merda! Já deu...

Ah, ia me esquecendo. Tem também o Trouxa, que é aquele que acredita que as coisas vão melhorar, então faz sua parte e age pelo certo, da maneira que pode, é claro. A cada geração que passa, a quantidade de Trouxas diminui. Portanto seu peidinho é quase imperceptível.

Hoje, o “Artesanato do Atlântico” pode ser considerado um sucessivo acúmulo de flatulências.
Suas ruas têm mais buraco que a bunda da Rita Cadillac, e olha que esse bunda vira e mexe é recauchutada. As ruas também.

As escolas são um nojo. Os casos de traficantes, marginais e outros tipos de escória que já dominaram as instituições públicas de ensino me deixam com medo de ter filho inteligente. Vai saltar de para-quédas, mas não vai pra escola. Prefiro filho burro do que filho morto. Ah Rodrigo, não exagera, vai?

No Guarujá até o professor Girafales ia tomar um apavoro de um aluno armado em sala de aula.
- Tá tirando, Mestre Linguiça? Perdeu, passa o buquê.

A saúde vai bem. Numa cidade que tem 2 prefeituras e 1 hospital, existe um Pronto-Socorro que faz juz ao nome, socorro! É o PAM (Prefiro A Morte). Parabéns à prefeitura que vai ganhar dinheiro com o PAM, locação da próxima temporada de Walking Dead e os zumbis já estão até por lá. Tomara que a produção tenha um kit de primeiros socorros.

A violência é um caso a parte. Da parte da manhã até a parte da noite. Guarujá já lidera o ranking de roubos no Estado. Duvida?

Assaltos, sequestros, estupros, assassinatos, novas casas de forró e bailes funk. Prolifera todo tipo de maldade. O ser humano não vale nada e o seu ouvido também não.

A cultura é......... ãh... cultura?



É um município que convive com o crescimento. Cresce o crime, cresce a miséria, cresce o trânsito, cresce o medo e cresce a pena. Pena por ver o Guarujá deixar de ser tudo que um dia se propôs a ser.

A culpa é de quem? Do peido que foi dado antes. A velha história do clube.

Ou talvez a culpa pertença ao Bonitinho, ao Zé-Povinho ou ao Guarujento. Quem sabe aos três.

E amanhã já nasce um novo salvador, aquele que pode dar um peido mais cheiroso que os anteriores. O próximo nome pode ser o certo. Pode ser o seu.

Juventino, José, Ciro, Oscar, Gustavo, Hernane, Paulo, Eduardo, Renata, Alexandre, Gaspar, Hermínio, Álvaro, Abílio, João, Domingos, Jayme, Raphael, Maurici, Waldyr, Ruy, Farid, Maria Antonieta. Quem será o próximo peidorreiro?

Aposto que ao lado dele vão estar os mesmos de sempre. Um Zé-Povinho me contou.


Eu tô te falando!

Um comentário:

  1. Guarujá é uma ilha no duplo sentido da palavra: tá descolada do continente e também da realidade.

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