Na cabeça, efeitos leves do álcool que havia a pouco sido ingerido na intenção
de aliviar o calor. O coração batia forte e acelerado, embalado por doses de
adrenalina que ainda deixava pequenos resquícios em sua narina, ou no seu
cachimbo. Não se pode ter certeza do que era mas estou certo de que ele queria
mais.
Percebeu que poucas eram as opções
naquela hora e naquele lugar, até que viu o nosso carro. Parecia fácil, o
modelo é antigo e farto em peças fáceis de comercializar. Não foi difícil abrir
a porta, afinal ele já estava bem acostumado a fazer serviços como esse, o que
era bom porque o tempo era curto.
Olhou pro horizonte rua abaixo e se deparou
com nada. Talvez um gato.
Horizonte
acima nada parecia chamar a atenção dos Guardas Municipais, confortáveis dentro
de sua cabine, com a TV ligada no Jornal da Globo ou talvez no Corujão, afinal
como já contei, não sei bem que horas eram.
Dentro
do carro entrou ligeiro, enquanto seu parceiro na moto já o observava da
esquina. Olhou pro banco de trás e sorriu, ganhara um agasalho novo. Com aquele
puta calor pensou que não o usaria mesmo. Pensou pra quem vender ou com quem
trocar. Sorriu de novo. Mexeu em pastas e papéis e não entendeu nada. Viu um
vasilhame vazio de Coca-Cola retornável no assoalho e ficou com sede. Muita
sede. O que não daria por uma cerveja?
Fez a
ligação e saiu acelerado, certo do destino. Tentou ligar o som mas ele não
funcionava. Só ela sabia fazer aquela desgraça pegar. Se fudeu! Não teve outra
alternativa senão ligar o som do celular. MC alguma coisa.
Foi
longe, bem longe! Nem imagino porque escolheu a nossa rua. Quer dizer, quem
disse que a rua é nossa? Pelo visto não é não. E lá vai ele sentido Jardim
Mirna. Sabe onde fica? Procura no Google Maps
e surpreenda-se.
Encontra
algum beco escuro e solitário, em decorrência dos goles de cerveja esbarra em
algum muro, poste, mureta, em outro carro, sei lá. Só sei que pela foto vejo
batidas e arranhões que não fomos nós que fizemos.
Rápido
ele age. Talvez acompanhado pelo seu comparsa da moto. Talvez com mais 3 ou 4.
Talvez.
Pegou
uma cerveja e deu um gole, acendeu um cigarro, reclamou que o som não
funcionava, tirou as rodas, a bateria, pegou meu agasalho, contou uma piada,
tomou outro gole. Espalhou os papéis pelo banco e os banhou em gasolina. O
cigarro está no fim. Cheiro forte de gasolina e noite estrelada. Já devem ser
lá pelas 4 ou 5 da manhã. Atirou a bituca e viu o clarão. O fogo sobe e consome
o banco que tanto me aliviava o cansaço no final de cada dia. E lá o abandonou.
Escondeu
as rodas, afinal ia ser bem complicado encontrar um comprador numa hora
daquelas. Pra finalizar a noite, só o agasalho já renderia o suficiente. Foi
fácil trocar por mais 2 pedras ou 3 pinos. Aproveita o quanto pode, pois sabe
que possivelmente não lhe resta muito tempo de vida vivendo desse jeito. O dia
dá sinais e ele desaparece quando o relógio marca 7.
O
despertador toca. Desperto levemente, mas logo pego no sono. Sinto o cheiro do
perfume dela e o beijo que me deu no rosto saindo pra trabalhar. Adormeço.
Acordo
logo depois, definitivamente pra não dormir mais, quando ouço: “Amor, cadê o
carro?”.
A
partir daí quem narra é a burocracia e o despreparo policial. Mas isso já é
outra história, tão triste quanto a que acabou de ler. Mas somos fortes, e
nossa carcaça não se queima facilmente. Nosso Deus nunca nos abandona, e o que
nos aguarda é grande e farto. Seguimos em frente, mas por enquanto vamos de
ônibus.

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